Consciência Negra e o Direito Constitucional Brasileiro

três pessoas negras fazendo sinal de resistência com as mãos levantadas e o punho fechado

O  Dia Nacional da Consciência Negra é celebrado anualmente em 20 de novembro em memória do líder negro Zumbi dos Palmares, símbolo da luta contra a escravidão morto em 1695. Esta efeméride, reconhecida como leis estaduais, destaca a persistente injustiça da discriminação étnico-racial que permeia várias dimensões da vida. 

A luta contra o racismo e pela igualdade é marcada por eventos emblemáticos, como o primeiro Dia da Consciência Negra em 1978 e as marchas subsequentes. Enfrentar o racismo é uma responsabilidade coletiva que envolve a desconstrução de preconceitos e a promoção de espaços plurais. A diversidade étnico-racial é uma riqueza compartilhada que fortalece nossa sociedade, e é imperativo que, como cidadãos, nos comprometamos diariamente a eliminar qualquer forma de discriminação. 

Apesar da recente legislação em prol da igualdade racial, como o Estatuto da Igualdade Racial, é crucial entender que a conscientização vai além das leis, cabe a cada um de nós tomar posição diante do racismo, respeitar a diversidade cultural e garantir oportunidades igualitárias. 

A prática persistente de racismo na sociedade brasileira viola os direitos e liberdades individuais, levando o legislador a tipificar o crime de racismo no inciso XLII do artigo 5º da Constituição de 1988. A Carta busca assegurar a concretização desses direitos ao estabelecer sanções para aqueles que os transgridem. O mencionado inciso, promulgado pela Constituição Federal de 1988, estabelece que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão conforme a legislação vigente. 

Esse dispositivo garante o direito à não discriminação com base em raça, cor ou etnia, ao mesmo tempo em que determina que a punição seja definida por lei. Essa abordagem visa promover o direito à igualdade, uma garantia essencial da democracia. Dada a gravidade da conduta e a intenção constitucional de erradicar a discriminação racial no Brasil, o acusado não pode obter liberdade mediante o pagamento de fiança, e o crime não prescreve. 

A Constituição de 1988 foi a primeira a tratar expressamente o racismo como crime, rompendo com abordagens anteriores que apenas o consideravam um ilícito, sujeito a natureza cível ou penal conforme a legislação infraconstitucional. O inciso XLII do artigo 5º está diretamente ligado ao direito à igualdade material, especialmente à tutela das diferenças, buscando a igualdade real por meio do tratamento diferenciado de pessoas em situações diversas. 

Isso é de extrema importância em um país como o Brasil, onde mais da metade da população é negra e ainda enfrenta o racismo em diversas áreas da vida. A Lei do Racismo, Lei n. 7.716/1989, concretizou as disposições constitucionais, estabelecendo punições para crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. 

Combater o racismo estrutural requer não apenas a defesa do direito individual, mas também do coletivo, ambos sob a proteção do Estado. Portanto, é responsabilidade do legislativo criar mecanismos para punir essa conduta por meio de leis infraconstitucionais, enquanto os operadores do direito devem garantir a execução das disposições constitucionais e legais. Para tanto, é crucial entender as diferenças entre racismo e injúria racial, considerando as mudanças decorrentes da equiparação feita pelo STF. Em geral, o crime de injúria está associado ao uso de palavras depreciativas referentes à raça ou cor com a intenção de ofender a honra da vítima. Um exemplo recente de injúria racial ocorreu no episódio em que torcedores do time do Grêmio, de Porto Alegre, insultaram um goleiro de raça negra chamando-o de “macaco” durante o jogo. No caso, houve a denúncia por injúria racial, aplicando, na ocasião, medidas cautelares como o impedimento dos acusados de frequentar estádios. O crime de injúria racial recentemente se tornou inafiançável e imprescritível também, mas este crime ainda é necessária a representação da vítima para que ocorra a instrução criminal. 

Já o crime de racismo, implica conduta discriminatória dirigida a determinado grupo ou coletividade e, geralmente, refere-se a crimes mais amplos. Nesses casos, cabe ao Ministério Público a legitimidade para processar o ofensor. A lei enquadra uma série de situações como crime de racismo, por exemplo, recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou às escadas de acesso, negar ou obstar emprego em empresa privada, entre outros. 

Com isso, vemos que o direito vem tentando combater o racismo estrutural com a tipificação do crime de racismo e injúria racial, tornando-os cada vez mais penosos para que a população consiga compreender a gravidade da prática desses crimes, fazendo com que nos tornemos uma sociedade na qual o racismo não será mais parte da nossa estrutura. 

Para tanto, as instituições educacionais têm o papel vital de incorporar valores de pluralidade étnica em seus currículos. A efeméride não é apenas um lembrete da necessidade de consciência negra, mas uma chamada para a compreensão das injustiças recorrentes que afetam áreas fundamentais da vida. A desconstrução dos mecanismos de reprodução de desigualdades é crucial para o florescimento de um ambiente, democracia, futuro e vida digna para todos.

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